domingo, 26 de setembro de 2010

Penúria

O legado da miséria da humanidade
Foi iniciado por feitio sórdido
Julgado pelo divino
Chamam de dogmas celestiais de bondade

Carregamos uma pútrida cruz nas costas,
Os urubus nos rondam, chamam de “ronda”,
Para conhecer a entrada do paraíso para essa nova geração de lástimas
Corja surda, cega e muda

Chagas abertas expelindo pus
Levaram-me a óbito, mas não eram minhas, morri de uma já clichê melancolia
Quero ver minha pátria liberta por além de jus
Não anseio felicidade momentânea com borra de liberdade mísera

Póstumas memórias levam-me
Por entre vermes
A multiplicar-se no esterco.
Concluo com um passado sublime, porém turvo.




"E todos eles pensarão o mesmo no conforto do sepulcro."

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Sujamente


Era ele um irlandês no avião viajando para o Brasil e tinha um volume extra preenchendo a sua calça frouxa, estava com a mão no bolso da calça, como se estivesse a acariciar um bebê, porém com uma brutalidade voluptuosa, com os dedos subindo e descendo...

Estava excitado e ansioso, lembrava que um amigo seu, de aparência rústica e simplória, ao contrário dele que era intelectual e sagaz, havia viajado ao Brasil uma vez no carnaval, viu mulheres praticamente nuas, mulatas com ótimas curvas e que dançavam com o corpo todo, requebrando delirantemente os quadris, algumas usavam saias longas e mesmo assim dançavam cheias de graça e exuberância de prazer, deixando com que a imaginação se fertilizasse e desse muitos frutos aos fetiches.

O irlandês, com quarenta e poucos anos, já havia trilhado por vários corpos e posições, mas nunca ouvira falar de tal gingado, nunca tinha vindo ao Brasil e veio com a intenção de achar o que ele tanto procurava. O sexo para ele virara trivial e não gostava disso. Instruíram-no a procurar uma mulher do mesmo nível intelectual, procurara e achou diversas delas, transava com admiradoras de Picasso, fãs de Freud, adoradoras de Hitler, maestras que reproduziam e endeusavam as sinfonias de Beethoven, mas a nenhum delas se entregara por inteiro e o sexo ficara monótono. Ficou em um grava estado de depressão, se colocasse sua vida em um eletrocardiograma apareciam apenas linhas retas, uma eterna constância mórbida ou até mesmo um eletrocardiodrama, galhofa penosa.

Era a última aposta de sair dos olhos cinza e começar a ver a vida com as suas mais diversas cores vivas, doença parasita de daltonismo social. Havia de achar uma mulata que reanimasse o macaco dentro dele e que mais uma vez sentisse luxúria de bode.

Não queria uma mulata qualquer, queria uma de seios fartos e quadris largos, que despertasse desejo só com o olhar, sabia que era pecado, mas preferia uma efêmera vida de pecador a uma efêmera e hipócrita vida de conservador.

Ele tinha uma fome insaciável, uma sofreguidão inesgotável e até quem o via comprando o passaporte sabia de todos os seus pensamentos sórdidos, disfarçava o riso, até mesmo os mais miseráveis que iam com o mesmo intuito riam, tinham uma imagem a preservar.

Desceu aflito do avião, nem sabia direito onde estava e não falava português, ia alimentando os olhos, mas os seus nervos estavam afoitos, não paravam, não paravam, tinha fome e parecia não se encher.

Enfim foi caminhando por uma rua e “onde estavam as mulatas nuas?”, andou, andou, estava quase desistindo quando, subitamente, em uma esquina, em um lugar retangular, viu muitas mulheres com saias longas, cabelos negros, peles morenas-jambo, lábios carnudos, só estranhou o fato de terem muitas roupas, viu que dançavam jubilosamente, pulavam e festejavam.

Entrou no retângulo e viu as pessoas ficarem de joelhos diante uma imagem de um garoto nu, pensou “súcia de brasileiras pedófilas e safadinhas, se elas se ajoelham diante de uma imagem de um garoto nu, imagino o que devem fazer na frente de um homem real”, sua braguilha abriu de tanta excitação, seria um paraíso, percebeu, mas não tomou atitude alguma, deixava seu corpo equilibrar-se com aquele calor do Brasil, clima demasiadamente afrodisíaco, sentia o alvoroço daquele lugar retangular, a agitação molecular fremia a sua carne.

Ele levantou a cabeça e leu “Protestant Church”, ele sabia inglês, notou que todos olhavam para ele e sua braguilha, viu o Menino Jesus no pedestal, pensou “imagine só os puteiros”.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Sexo

Lírio extasiante
Perfume hostil
Nocivo viajante
De meu nariz vil

Campos de entonação neutra
Estrondosa súplica oculta
Rompendo a doce inocência, transforma-se em vermelho
Luxúria calada, fechado ouvido

Clamo agora essa tua fria carne
Como verme irei penetrá-la
Decomposição simultânea angustiante
Pérfida, nojenta, mas irei degustá-la

Entraremos em dança rítmica
Entre túmulos silenciosos e rosas sujas
Sinta o pútrido cheiro
Implore esse osso cheio de ócio.

sábado, 11 de setembro de 2010

Boate GLS

Pobre madrugada viva e que procura vida, encontra-me, eu, alma desalentada viva e que anseia vida, recluso em leito fatídico, arrasta-me para esse papel funéreo e sugador, suga dor, de minha própria alma, que é enferma de natureza.

Porém, o meu intuito não é te comprazer, leitor, criatura vil, que procura o seu sorriso sem dentes nos versos lúgubres de escritores sugadores, apenas para que saiba que é feliz na sua infelicidade surda, mas também não vim descontar a minha miséria consciente no teu esterco, que reluta no inconsciente para vir à tona, leitor presunçoso.

“Para que viestes, então, desvendador de verdades?” Galhofa. Vim para capturar esse ar intangível, pena é que ele não fica em sujo papel, se fica é para sair logo em seguida, ar com ar de desdém, inescrupuloso genuíno. Maldita ideia fixa.

O ser humano se julga ser único, peça rara, que nada... Ser humano é elemento químico qualquer, é tão comum, que dependendo da psiquê do analisado, encontra-se facilmente na tabela periódica e olha que nada tem de artificial.

Ser humano não foge à regra, obriga-se a pensar como exceção por vontade de superioridade, lástima penosa. É sólido, líquido ou gasoso.

Quando sólido, deixa-se ficar frígido, enclausurado em si mesmo, busca forma larga e concisa, é casca firme e anti-sentimental, “pequeno elfo, por onde queres travar o teu caminho? Olha tuas chagas, nesse espelho granívoro”. Os outros estados físicos o invejam, pois o consideram forte para o “bando”, mas esquecem de que estão a olhar para a casca, ele demonstra falsa estabilidade. Arranca tua máscara, mostre-me as tripas.

Quando gasoso, é agitado, tão agitado, que tem por medida de precaução certo tipo de repulsão, justifica-a como um impedimento da poluição da alma pútrida dos outros, como se fossem contagiar os seus sentimentos pueris com os sentimentos pérfidos de outrora, difere do enclausuramento, pois não se tranca, tranca os outros por se julgar excelso. Admite a forma do recipiente por desespero adaptativo. É cheio de si por exalar um calor confortável e tranquilo, esse tem falsa instabilidade, julga-se instável e é agitado para esconder a sua estabilidade mórbida e sua personalidade pessimista e decadente. Arranca tua casca e fecha essas cicatrizes artificialmente maquiadas, mas na essência, podres.

Quando líquido, possui forma espalhafatosa e tenra, é ocioso e indiferente, adquire a forma do recipiente não por compulsão adaptativa, mas por preguiça de relutar, simples acomodação, é impassível em tudo, não clama por mudança e nem se enfeita para ostentar ilusões, vive com o tempo e morre com ele, sem expectativas, mas quando esquentado e borbulhante não vira gasoso, porém fica morno, por capricho, e se fica um pouco mais frio é por passatempo. É transição e se aproveita com os seus limites. Arranca tua epiderme e prove qualquer experiência de corrosão.

Ser humano, nada além de um pequeno ser classificável, serve-me para escarro e escárnio. Ser humano vive de aplausos, arrancarei então minhas palmas para ver o cessar dessa ganância...














Com sangue nobre e plebeu, estão fadados, nesse lameiro, a multiplicar-se como larvas no esterco.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Save Our Souls



Dirigi embriagado por causa do efeito do vinho, estava tonto.
Repentinamente, estava eu diante da porta daquele quarto, o número na sua porta era: quinhentos e cinco, estava ofegante por ter subido as escadas rapidamente e o efeito da bebida evaporou junto com o meu suor. Não sabia o que fazia ali, quer dizer... Eu me obrigava a pensar assim.
Encostei meus ouvidos e minhas mãos na porta, em minha imaginação você estaria esperando do outro lado. Temia o resultado de pôr as chaves, hesitei bastante antes de entrar, as lascas de madeira na porta queriam zombar de mim, pois de tanto voltar ali em busca do abrigo dos braços dela, o quarto 505 virara quase um lar, porém não era somente meu, então não era um lar, pois entravam e saíam estranhos com uma grande freqüência, ali era o farol dos naufragados perdidos nas próprias lágrimas na escuridão vasta da madrugada.
Girei lentamente a maçaneta, à medida que empurrava a porta, ela rangia loucamente anunciando a minha entrada.
A sala estava vazia, mas a rudimentar cadeira de balanço continuava com o seu movimento rotineiro, andei um pouco por entre aqueles móveis, sentindo aquela nostalgia ir se dissipando.
Sentei na cadeira de balanço, tirei o pó que a cobria e no criado-mudo, que estava ao lado, repousava um livro chamado “como os homens se comportam”, ri do título e da caricatura de uma mulher soerguendo a sobrancelha na capa, abri na página marcada e a levei ao nariz, tinha cheiro de dinheiro, fiquei com nojo e devolvi o livro ao seu lugar.
Percebi então que o quarto 505 tinha essa magia de me fazer esquecer os motivos pelos quais estava ali, deixando-me absorto e risonho até mesmo com um livro fútil.
Um odor de lasanha se propagando na sala. Puxei o livro novamente e abri na página marcada, li: “faça a comida preferida dele quando vocês brigarem feio, e ele tiver saído de casa batendo muito forte a porta, pois quando ele voltar pedirá, imediatamente, desculpas”. Corri, avidamente, pelo corredor, deparei-me com ela na cozinha e diante do fogão. Ela nunca tinha cozido algo para mim antes. Involuntariamente, brotara um largo sorriso no meu rosto, um mar de água doce desabara diante dos meus olhos. Ela também sorriu e veio serelepe ao meu encontro, passou a mão no meu rosto para enxugá-lo, então me abraçou.
Uma extasiante e voluptuosa sensação. Mais tarde, eu me açoitaria mentalmente por ter vivido o momento que durante toda a minha vida eu havia esperado. Sem dúvidas, eu iria querer passar o resto da minha vida com aquela mulher e já não necessitava mais dizer o quanto eu a amava, pois ela teve a certeza disso quando me tocou.
Ela falou: agora o quarto 505 é o seu lar também.
Descobri que eu sou uma fênix, renasci do pó. 505! 505! 505! Socorro.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Albinismo Mental


Estou quase que forçando a extração de algumas letras, frases e linhas, nada que está a minha volta vale a pena transformar em texto, porém não escrever me dá nostalgia de escrever e algo fica vazio durante a semana e é ainda melhor a sensação pós-escrito, sensação de liberdade que esporra...

Mas o que escrever sobre essa cidade? Escreverei sobre os tantos buracos na estrada, o que contradiz isso é que a cidade já é um próprio buraco, então não, não escreverei sobre isso.

Há um bandido em cada esquina e os policiais ora estão comendo, ora parando civis e batendo neles, no final sempre dá no mesmo... O ladrão fica feliz, o policial fica feliz e o civil assaltado e espancado.

As greves de ônibus então, essas são o carnaval dos motoristas, ocorrem uma vez por ano, param de trabalhar e ficam bebendo, pena é que não tem escolas de samba para torcerem.

Os jogos de futebol sempre nas quartas-feiras, sabe como é... Pancadaria, gente sangrando, gente pulando e comemorando, som alto de carro, isso nem é mais notícia, só servem para alimentar os brasileiros famintos pelas tragédias que passam nos programas de TV, que pontualmente assistem, dizem algo como: “Ele era tão novo...”, “que morte trágica” e “o mundo está tão perigoso”, ficam enfurecidos na frente da TV, mas quando o programa acaba não fazem algo para mudar aquela realidade e fingem que não viram, porém o fervor da fúria volta quando vão falar com os vizinhos, que de tanto conversarem, já não tem assunto e vão falar sobre o que viram na TV.

Acadêmicos presunçosos andando nobremente com a cabeça erguida, nariz empinado e ar austero, enquanto os “excluídos” estão subindo morros para comprar drogas e ninguém se importa, todos estão acomodados, todos estão conformados, fico me perguntando onde está aquele fervoroso sangue revolucionário que corria nas veias delirantemente de índios, negros e protestantes. Os brasileiros estão mortos.

Eu não tinha nada para escrever e saiu isso.