Do momento em que eu acordo até o
momento em que eu me deito, eu amo um amor sem endereço. Não do jeito
desenfreado e desesperado que comumente tem-se visto por aí, todo mundo com
essa necessidade fatal de se esparramar em alguém e andar de mãos dadas nas
esquinas, como se ninguém sobrevivesse a si mesmo e precisasse ter outra pessoa
pra afirmar algo pra si ou pros outros, envaidecer-se e/ou ter a sensação de
conquista.
Pra mim, amor sempre foi mais, sempre
com um tom mais sério, sempre pesado com suas responsabilidades, profundidade e
compromisso, um laço que se fortifica calmamente com o tempo e não às pressas
como quem arruma as malas da viagem na véspera.
E esse último é responsável por uma
quebra, uma desestruturação, uma desilusão que pode gerar feridas incuráveis,
provocando medos e fantasmas que, por vezes, são insolúveis. Isso por conta do
amor às pressas que cai em desgosto na rotina, que perde o encanto quando é
íntimo, que cai um pedaço a cada hora, que amarga o doce, que não sobrevive
fora das primaveras, o amor que ama o fantasma inexistente de outra pessoa, a
projeção admiradora que se desfaz em pedaços até sobrar a pessoa por ela mesma
e aí sim começa o desafio e se põe à prova a firmeza do sentimento, porque o amor
não é um sentimento que existe apenas em bons ares.
Diferente do que muitos pensam, amor
não é uma chama que brilha intensamente no escuro e que pode se apagar à menor
brisa, deixando-nos às cegas novamente nos levando a uma busca infinita de
outra luz. Tudo ao nosso redor tem sua própria luz, logo se estamos no escuro é
porque temos os olhos vendados e se achamos que o amor é a única luz que nos
move, acertamos, mas não a silhueta estupidamente criada pela imaginação e sim
o amor por ele mesmo, com garras e dentes, com os membros amputados e caolho,
monocelha e espinhento, luz que não se sustenta sem manutenção, sem remendo e
ninguém estará apto a encarar esse amor se não tiver se visto de frente, com os
olhos bem abertos, o próprio Frankestein, como um coração fora d’água.