segunda-feira, 28 de abril de 2014

A fome dos olhos


Com as pernas meio bambas, as pálpebras pesando mais a cada piscada, o corpo quase inteiro relutando para dar o próximo movimento, a sua roupa agora amassada, mas você já não se importa mais, os botões fora do lugar, a braguilha entreaberta, os cabelos bagunçados, enfim, ao fim do dia, o aprumo e o zelo dedicados à aparência pela manhã já perdera o ar encantador e jovial que tinha.
O andar vacilante de um embriagado de ideias que tropeça sempre nos mesmos pensamentos mórbidos que aparentavam, até então, insolúveis.

Porém, o que nunca desleixa, nem vacila, o que não tropeça, nem se cansa, são esses olhos nervosos, sempre cheios de energia, que procuram incansavelmente as respostas que nunca estão lá, então olha ali, aqui, acolá e mais distante sem nunca achar, mas sempre carregando aquela esperancinha de encontra-la em uma esquina, numa boceta ou n’outra dose de tequila, chegando a extremos de esforço e dispêndios de vitalidade exagerados, mas nunca o suficiente para parar os olhos que procuram ou frear esse torpor de pensamentos de esperança. Esperança essa constante, tão ingênua quanto angústia, que nunca para, que nunca pode parar, porque sempre você pode estar perdendo a Coisa, a Coisa que você nunca teve na verdade, que nunca acha, mas a quer, mais e mais que qualquer outra... coisa, porque parar é a própria morte e viver, correr atrás, movimentar-se, busca-la é viver e, não que eu sinta a vontade de parar de perseguí-la, mas acho que eu deveria aprender a morrer um pouco mais, até porque por leitura e vida, eu sei que a Coisa que completa não está em nenhuma coisa, restando a todas as coisas somente outro jeito de morrer particular a cada uma e, de tanto acumular pequenas mortes, logo há de se aprender a aproveitar até a própria morte, mas a promessa me é muito tentadora...
De flor em flor, os beijos de quem quer ser fênix.