quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Um Humano Assumido - O Cheiro do Ralo (Filme)




Descobri a gota que sou, luto pela vaidade e reconhecimento alheio, logo eu, um defensor do meio-ambiente e anti-capitalista que entra em sala de aula com um sorriso fazendo pré-julgamentos, comparando os outros a pedaços de merda e me enaltecendo perante a eles, pobre de mim que sou frustrado com a minha incapacidade de me aproximar deles, prefiro dizer que os problemas são os outros quando esse pedaço de bosta que exala um cheiro ruim sou eu, mas eu não quero que descubram que o odor é meu, então ponho toda a culpa no ralo, que está entupido, porém somente eu uso aquele banheiro e toda a merda é minha - “A vida é dura”.

                Acabo pensando que nunca gostei de alguém de verdade, vivo em relações de merda, nunca amei os defeitos de ninguém e, quando os percebo, saltam-me à face como em alto-relevo e começa tudo de novo, o desgaste, o enjoo, o empate, o sufoco... No fim, todos temos feridas incuráveis e que têm cheiro de decomposição, mas as escondemos e colocamos perfume – “O homem é o deus do conforto”.

                Sou o estranho e imbecil do capitão do time de futebol americano, mas sem a popularidade do mesmo... E todo o meu amor vira bunda e faço qualquer coisa por ela, as mesmas bundas que vão entupir de merda os ralos de outras casas, talvez até piorem o estado da minha...  “O ralo me trouxe a bunda, um presente do inferno”.

                Já nem sei por que luto para a minha vaidade e o reconhecimento alheio, não sei o que eu vou ganhar, nem mesmo sei se quero ganhar, sei que eu luto porque não tenho mais porque lutar, minha vida me satisfaz e todos nós temos a podridão de querer aumentar o ego brincando de admiração com aqueles que habitam o nosso ralo... – “Eu não me importo com ninguém, só não quero que eles pensem que o cheiro do ralo é meu”.

                O encanador cobra caro para o concerto e preferimos guardar o dinheiro e só tampar aquilo com cimento, pondo várias camadas pra acabar com aquele cheiro horrível, mas um dia o cimento cede e o ralo volta a respirar, acabamos sendo tragados pela própria bunda que fez a merda...  “A culpa toda é do cheiro do ralo”.

                Tudo para recolocar a culpa da nossa frustração nos outros, fumando um cigarro e rindo... – “Os convites já estavam na gráfica! O que os outros vão pensar?”

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Filha da puta



Em todos os portos que desceste.
Em todos os cais que repousaste.
Por onde tu andaste, querida...
Deixou três pontos em testas e dor... E dor...
E foi em um forte, que desmoronaste o mais duro dos corações.
Quebrara barreiras, rompeste fronteiras, sem nenhuma permissão.
Foi um vento, atordoante, dolente e covarde.
Escondeste seus túmulos do passado morto em bocas podres que almejavam a pureza...
Eram nomes e números, nomes e números, e cidades... Sim, cidades, portos e cais.
Dos solavancos, de banco-em-banco, sorrateira ladra de um futuro ventre de amor e dor...
Passara a cuidar dos enfermos extasiados no teu colo realengo, em teus pés demasiados peitos diferentes e variados, muitos, muitos e um só sentimento, guardava-o pelo passado e tentava o encontrar no presente de bocas-em-bocas, de bancos-em-bancos, cais, portos e cidades... E um só, um só túmulo...
Óh, majestade... Guarda em ti meus plebeus sentimentos, guarda em ti minha mais nobre perversão, mas por favor... Não esqueça que não sou o teu pão que te alimenta todos os dias e meu nome, sim... Meu nome não é o dele, não é Johnny... Talvez você nem queira sabê-lo, basta substituí-lo com alguns incensos...
Mas para de cuidar de mim.
Para de ir e vir.
Você não tem esse direito aqui...
Sou o rei de mim e não venha me impedir
De não querer ter os meus dias ruins...


Cais, portos, músicas da Cássia Eller, fora assim em todos os portos? Fora assim em todas as pousadas? Roubara-me e preenchera com ilusões de volta, de canto. Enchera-me, enchera-me de beijos e apertos, mas acabara assim, eu sem um fim... Você a rir.
Peço apenas que se lembre de mim quando provar o vinho da luxúria e tudo o que poderíamos ser e não fomos...
Mas, por favor, por favor... Vá ou fique de uma vez.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Para ler sem pausas

Não me contento mais com minhas veias, quero e desejo ser mais, eu tenho que fazer mais. O caos dominando e a desordem na minha mão, eu quero ser mais, tenho que fazer mais. Um véu que me encobre do mundo e eu querendo rasgá-lo com garras, unha e dentes, quero deixá-lo ferido tanto quanto eu, suas feridas curarão as minhas, um véu que me separa da alma, quero união, quero ir mais fundo.

Esses pensamentos que me percorrem desvairadamente e a dor na minha mão que já não acompanha meu peito, eu quero rasgá-lo e na minha miserabilidade rotineira darei um brado que revigorará um exército, um urro de peito, a primitividade bruta e instintiva que me falta, sairei do controle de mim e de minhas pálpebras tão fatigadas, sou a soma do mundo e não terminarei apenas como um adubo de plantas.

E esse caos que não deseja ordem gritando e sonhando, não pense, só acompanhe a minha mão, tenho que ser mais que linhas, tenho que ser 3D e a entrada terá o seu preço aumentado. Não almejo ordem, almejo ritmo. Mais, MAIS.

Já não quero mais somar, quero multiplicar, daqui a algum tempo será uma progressão em exponencial e a porra do tempo biológico me limita. Tudo que é limítrofe é orgânico, tudo que é orgânico, decompõe-se; abrirei os horizontes, rasgá-lo-ei, como os lusíadas, seguirei velejando em tempestades...

Se for inevitável ser nutriente para verme, farei o possível para que eu seja o mais suculento dos vinhos e ele se embriagará por noites devorando minha carne fumegante, pois mesmo depois da morte, estarei eu irradiando vidas.

Volto no tempo e percorro o espaço, sou a gravidade de tudo que já fui e sou, agora posso distorcer o espaço-tempo e optar por ser buraco negro, apesar de desconfiar de já o ser, é absorver, sugar vida, um poeta morto, que mesmo preferindo a morte, devora a vida...

Então pulsa por ser involuntário, mas, de qualquer jeito, involuntário seria, porque até mesmo os suicidas se matam por querer a vida.

Tudo que escrevo são rascunhos inacabados de algo, porque sou um rascunho, porque tu és rascunho e a vida o longo ensaio de uma peça que nunca se realizará e os fortes sobrevivem, mas o sobreviver é um adiantamento, não evita...

O que não me poupa é o antagonismo, que por ser agonia ou anta, vem me visitar com uma sabedoria inculta, não oculta, exposta e a jorrar pus, sabe como é, aquela história toda de sistema imunológico e corpos estranhos.

Rasgaremos o véu, veremos a destruição do sistema solar, as promessas cumpridas e o apocalipse, culminado com o aniquilamento do nosso planeta, tal qual como o conhecemos, porque, como vulcão, toda destruição tem alguma dose de criação.

E a lua sempre estará a salvo.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

She & Her - Me

Uma é cadáver e repousa sobre o meu peito, só mostra alguns sinais vitais quando o meu coração, em vão, tenta bombear sangue para os nossos dois corpos, porém desprovido de razão ignora o fato de que um coração não pode sustentar dois corpos.

A outra é abelha e me pica enquanto durmo, vem ainda com a boca lambuzada de mel me beijar, finge receber ordens e escorrega dos meus dedos com a umidez do seu corpo, vive de arrotos.

Mas, veja bem, meu bem, ela está quando você sai e o nome dela não é Saudade.

Uma tem meu sentimento, a outra acha que o tem, mas quando abrir os olhos notará que é a reação do meu corpo ao passeio das suas mãos e não é enganar, porque é recíproco demais para ter agente causador e hospedeiro.

Uma é serena e é responsável pelos acalentos, a outra me causa agonia e é responsável pelos meus gemidos à meia-noite, elas são o equilíbrio, caso desequilibre ocorrerá dilaceração dos tecidos, porque uma não é “uma” sem a outra e vice-versa.

Uma tem lençóis manchados de outras paixões, a outra já tem todos os meus lençóis e são intrínsecas e se misturam a ponto de uma ser outra e outra ser uma.

A ti entrego a boca e a ela a alma, meus lábios com dentes, meus dentes com alma, minhas vestes ardentes, meus pedidos de calma. Enquanto tu não seres de corpo e ela não ser de alma, irão se completar para sempre sobre meu colo repudiante.

Elas as rainhas, eu um condenado a amar duas feito um escravo que por nunca ter nada se esbanja com o tudo e acaba tendo nada, sou prisioneiro da paixão, imigrante do amor, servo da razão, mas um amaldiçoado incapaz de escolher.

Peço, desde já, perdão por carregar três corações sangrentos e ter que atirá-los no rio, tudo que eu sempre quis, maldito seja este ditado, por água abaixo.