terça-feira, 8 de junho de 2010

Aimoré (Trilogia do Ego - Parte 2)




Ambas as faces. Ambos os versos. Ambos, simultaneamente, sou. Eu sou um dado. A verdade possui mais de uma face. Clamem o cubismo, que grandiosidade pode ser demonstrada em apenas uma única palavra?

- Eu possuo trajes e máscaras com cera e sem cera. Participando de uma peça dramática, posso me remodelar, você consegue ver? Tudo isso é para você, para encantar a platéia que assiste alvoroçada, ansiando o desfecho do espetáculo. Tudo arquitetado, cada passo e gesto planejados. O imprevisível será a tua reação, por isso não é você que me assiste, é o contrário e do palco a visão é privilegiada.

- Máscaras de tristeza, angústia, felicidade e ciúmes e por trás de cada uma, guardo um sorriso com lascívia, aguardando a tua fragilidade para o bote. Descuide-se, descuide-se. Não resista. Se entregue!

Repentinamente, alguém na platéia se levanta e fala:

° Que futilidade! Não consegue ver a sua imagem deplorável e sôfrega? É realmente você o manipulador desse jogo? Certeza? Pobre criatura esconde-se e morre de inveja dos sentimentos alheios, protege-se dentro do casulo, anuncia-se metamórfico para ocultar a sua simplicidade, finge medo e competição, encolhendo o peito para alcançar seus fins.

° A vida real é árdua demais para uma criatura que nem conseguiu encontrar a própria identidade, é tão lastimável observar você e seu sorriso nervoso, olhando para os cantos, temerosamente procurando alguém que consiga desvendá-lo. O seu prazer recôndito traduz-se do medo que você tem da própria sombra, acabará por se autodestruir, consumindo-se com seus próprios fios!

- Quem é você para tentar me decifrar? Oh, grandioso mortal, não tente entender. Você na platéia, só consegue ver as maquiagens superficiais e diz-se capaz de me compreender por completo, apenas observando minha complexa casca. Eu sou uma fusão, calorosa e agitada, enquanto você tira as próprias conclusões do que observa. A platéia agonizando indaga: “Por quê? Por quê? Explique-nos!”. Contorço-me de tão vasto e intenso prazer, corroborando minhas hipóteses lançadas, um uníssono me escapa, quase lancinante, desdobro-me e deixo por me escapar o “alívio”: “Aaaah”, que sensação nostálgica, eu quero de volta aquele instante do clímax do gozo do conflito.

° Que sarcástico você, hein? Diverte-se com a própria dor e causa-nos pena nessa peça dramática, para conseguir auxílio e conforto, enquanto perfuram os outros com seus espinhos invisíveis quando se aproximam, querido ouriço.

° Fica estático nessa velha pose de propaganda de jeans, ora de mudar a estratégia, não acha? Ludibria, persuade e onde está a metamorfose? Que ingênuo, que ingênuo! Finge até para não querer ver as próprias feridas e para onde você irá fugir agora?

- Não necessito de fuga! Sou superior quando corro com minhas espadas, esses seus olhos corajosos e essa voz desafiadora não me amedrontam, pois vejo suas pernas tremendo e isso me revigora. É quase em tom humorístico que escuto seus gritos desesperados e silenciosos. Se eu não consigo ver, você tapa os ouvidos. Você agoniza por dentro, e não é de prazer, pois entrou no jogo e agora as paredes desse labirinto estão se fechando sobre ti, então pede para que eu fuja como ato de urgência apelativa, para que vença. O medo me pertence? “Rá!”

° Você é de natureza fraca! Não quis aceitar o seu complexo de inferioridade e construiu um complexo de superioridade para substituí-lo, porém não conseguiu notar que agora transborda de insegurança e neurose, você se perdeu quando rejeitou a si mesmo e não sabe mais como veio ao mundo e desobedeceu a sua essência, transpassou-se nos limites e não consegue voltar a sua forma original.

° Suas espadas estão cobertas de sangue, isso a fez perder a capacidade do corte e estão já enferrujadas, pois passaram por um mar de água doce e não as trocara. Você é imaturo em acreditar que um mentiroso não pode ser enganado, herdei o seu ilusionismo e uso-o contra ti mesmo, tremendo minhas pernas para fingir. Porém não há sorriso, há pena...

- Ousado! Seu bastardo! Seu humano desprezível! Como ousa usar meus próprios truques para me enganar? Está vendo? Nem mesmo você conseguiu resistir à luxúria da Mentira, agora consegue sentir esse prazer? Critica-me, conclui que sou de fraca natureza e no fim não mostra ser muito diferente! Que hipócrita!

- Humanos sempre serão assim. Nunca saberão como controlar os impulsos, porém seja bem-vindo, está a um passo de se tornar um de nós! Pare de tentar me definir, você não conhece nem um terço sobre mim.

° Que discurso mais repetitivo. Desculpe, terei que lhe revelar: sou muito diferente de você, não sinto prazer algum em observar pessoas arrancando a própria alma para lhe entregar, enquanto você chora lágrimas de alegria, os desprezíveis não enxergam e você se sacia!

° Na verdade, você fala muito dos humanos e tem inveja deles e sua capacidade de ter emoções! Vive solitário e em um campo vazio e vasto, a única coisa que sente é solidão, o resto é a droga que toma para fugir da realidade. Você sente inveja do sorriso que lhe oferecem e resolve trancar-se dentro de si, um perfeito caramujo.

- Que humilhante! Humilhante! Você é o pior de todos! Quem dera que um moleque como você, entenderia... Um humano me entendeu! Hu-mi-lhan-te! Eu... Sinto inveja dos humanos, inaceitável.

° Transforme-se em cinzas cinza e então sua existência não terá sido em vão, irei fagocitá-lo e tomar seus resquícios vitais para ter mais um conflito, então um novo ser surgirá. A antropofagia é verdadeira, pois herdo agora o teu cinismo complacente e me encho de mim mesmo, tomarei agora esse vinho, as sobras serão nada além de defecação.

Virou-se e, subitamente, metade do seu corpo estava mergulhado nas sombras, notou minha presença e ficou me fitando fixamente com um olhar insano, então revi algo familiar: estava renascido o tortuoso sorriso, porém desprovido de lascívia... Ou as sombras mesmas não me deixavam ver o outro lado da face.

Um comentário:

  1. ENTÃO. O comentário que eu ia postar ontem não é nada melhor do que o de agora, e você não se satisfaz com um "Eu curti", então, vejamos. Eu bem concordo com as 'multifacetas'. Por mais que tenham sim, seu lado bom. As vezes é bom mentir, se esconder e se guardar só pra se proteger mesmo. Claro, tem gente que usa isso para o lado Lord Voldemort/Tom Riddle da força, mas... Enfim. Tá ótimo seu post. E se acostume com o meu "curti", porque eu curto essa palavra, acho estilosa hehe. Tá bom.

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