domingo, 13 de junho de 2010

Emético (Trilogia do Ego - Parte 3)


Uma azia lancinante subindo no meu esôfago acompanhado por uma ânsia desesperadora por causa daquela queimação interna, então subiu de uma vez com o enjoo que tive causado pelo nojo repugnante que senti.

Olhei aflito para o chão, uma tontura súbita, dei alguns passos para trás ainda apavorado, acabara de vomitar um olho e um braço. Ainda confuso e tonto, não sabia o que significava aquilo, mas sabia que logo iria descobrir, pois aqueles restos mortais fizeram o nojo reaparecer e sentia aquilo subindo novamente, dessa vez quase se arrastando, pois parecia não querer me abandonar, mas tinha uma força quase sobrenatural expelindo aquilo para fora de mim.

Estava vomitando agora, escarrando aquelas coisas pútridas, estava de olhos fechados, não iria querer me ver no meu próprio holocausto, presenciar a minha morte...

Cessou. Aquela sensação de enjoo tinha passado depois daquele grande conflito entre irmãos que dividem o mesmo espaço e agora eu sentia que não tinha mais aquelas substâncias invasivas e parasitas dentro de mim.

Caí de joelhos, sentia algo flácido sob mim, nem queria imaginar o que era e queria que ninguém tivesse me visto em estado de pura lástima penosa, isso iria ferir muito meu orgulho. Enfim, abri meus olhos como se estivesse acordando aos poucos... Vi uma montanha de corpos... Atordoado, pasmo e vivendo uma realidade surreal... Havia sangue em minhas mãos... Meu sangue! Não, não era meu. Era daqueles tantos corpos no meu quintal.

Senti-me leve, senti-me livre, êxtase e empolgação rítmica que surgiram repentinamente. O medo havia escapado diante minhas glórias jubilosas. Agora eu era apenas eu, era o único, era o milhar separado do todo, era só um eu por mim.

A casca que julgava tão complexa havia desfalecido, senti-me desprotegido e simplório, vulnerável e com fobia a tudo. Era essa a minha natureza? Ser um eterno covarde? Fiquei inquieto e voltei a pôr aqueles corpos dentro da boca, mas não conseguia degustá-los, sempre voltavam ao chão.

Abri um sorriso, havia entendido que agora eu era apenas eu e teria que me aceitar com aquele vazio no estômago, viver sem me esconder atrás de corpos que não eram meus, ter sorrisos verdadeiros e não lascivos por mentiras que nem sequer eram minhas.

Agora era humano, não mais uma abominação de palco para fascinar por breves instantes. Agora eu era a plateia, impressionava-me com o espetáculo, porém quando estava voltando para casa ria comigo mesmo por ter me impressionado com a encenação de um palhaço infeliz maquiado com um forte sorriso vermelho.

Joguei os corpos fora e deixei que aquele espaço vazio fosse preenchido completamente pelo amor que compartilhava.

Não precisava mais ingerir corpos para mudar e agora mudava a minha essência por puro instinto e diversão, observava as consequências, incinerava meus ossos e depois me consertava ou consertavam.

Sou novo a cada dia e me foi concebido o dom divino de me renascer.

3 comentários:

  1. Estava vomitando agora, escarrando aquelas coisas pútridas, estava de olhos fechados, não iria querer me ver no meu próprio holocausto, presenciar a minha morte...
    Fodah'

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  2. Gostei muuuito desse post.
    "era só um eu por mim."
    Metáfora é uma coisa abençoaa e.
    Mas então, sempre tem aquelas situações em que não podemos nos expressar da maneira que queremos e falar o que pensamos ( green day x the cranberries, né mardhem?), mas é só termos liberdade pra isso pra nos sentirmos completamente bem, eu por exemplo, porque eu adoro falar e discordar nem que seja pra irritar, ou não, eu quase não faço isso né, mas enfim. Acho que você entendeu e se não entendeu, acostume-se. qn

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  3. "Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las."
    Voltaire

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